Encontrar ferries sem operar ou sucateados é uma cena comum no Sistema Ferry-boat. – Foto: Reprodução/Jornal da Midia.
Reportagem ampla do jornal Correio, assinada por Larissa Almeida, mostra um novo e completo relato sobre a caótica situação do Sistema Ferry-boat. Lembrando sempre, que o sistema é administrado pela Internacional Travessias graças a uma concessão de 25 anos do Governo da Bahia. Na época, o governador do Estado era Jaques Wagner, hoje senador.
Confira abaixo trechos da reportagem de Larissa Almeida, no Correio:
Ao chegar no Terminal Marítimo de São Joaquim na manhã desta sexta-feira (5), a movimentação rápida dos passageiros rumo a parte interna do local indicava a proximidade do horário de embarque no Ferryboat Maria Bethânia, previsto para sair às 11h. Ainda faltavam 20 minutos e a fila de carros estava pequena – seu fim dava na entrada do Terminal – bem diferente do alto fluxo dos últimos dias de 2023. A reportagem embarcou para conferir de perto as condições da travessia Salvador – Itaparica e Itaparica – Salvador.
O primeiro passo dessa jornada foi a compra do bilhete que dá acesso ao transporte marítimo. No grande espaço reservado para filas e organizado por corrimãos, o calor fazia com que as pessoas – que não paravam de chegar para embarcar às 11h – passassem constantemente a mão no rosto para aplacar as gotas de suor. O grande toldo que cobre o local, assim como a falta de aparelhos para a ventilação, também não ajudavam a diminuir os efeitos da temperatura.
Para o alívio e certa surpresa de todos, uma vez que só havia dois guichês em funcionamento dos seis instalados ali, a fila de pedestres andou depressa. Em cerca de cinco minutos, o bilhete unitário foi adquirido por R$ 6,50, valor vigente de segunda a sexta – aos sábados, domingos e feriados, a tarifa custa R$ 8,60.
Já no caminho para o Ferryboat, chamou atenção a sujeira em todo o trajeto. Desde o local reservado para a fila de pedestres, era possível notar o chão poluído com fragmentos de papéis, embalagens, bagas de cigarro, tampinhas e derivados. A má higiene, questão apontada por passageiros como o principal problema do sistema de transporte operado e administrado pela Internacional Travessias (IT), deu as caras na embarcação logo na entrada. Nas laterais do modal, onde os passageiros se espremem entre carros, caminhões e motocicletas para subir as escadas em direção aos andares com assentos, a sujeira se misturava aos desgastes da estrutura enferrujada do ferry.
Acostumada a fazer a travessia pelo menos duas vezes na semana, a aposentada Dalva Luciano, 75 anos, preferiu ficar sentada em um dos poucos assentos na parte térrea do modal, ao lado dos carros, por conta da falta de higiene nos andares superiores. “O que não falta são baratas miúdas lá em cima. Já ocorreu de eu ir ao banheiro e voltar sem usar, porque até fezes tinha nos sanitários. E todos os ferries são assim, até o que era mais ampliado e tinha lanchonete [Zumbi dos Palmares]. Eu mesma não compro lanche lá, prefiro comprar na mão do ambulante”, afirma.
Outra queixa de Dalva é quanto à ausência de profissionais de limpeza durante a operação do ferryboat. Segundo ela, antes era comum ver um funcionário passando pano no chão, mas agora isso se tornou raridade. “Eu fico sem palavras. Acho que muito descaso do governo, que só faz botar material, mas quem que zela? Reclamamos, mas ninguém resolve nada”, desabafa.
No tempo em que a reportagem passou na embarcação, de fato nenhum profissional de limpeza foi visto. A sujeira no espaço, no entanto, serviu para uma ambulante usar o problema como estratégia de marketing para vender produtos de limpeza. “Com esse produto, passou o pano e veja só como ficou o chão do ferry verde, limpou a sujeira e até mudou de cor”, anunciava enquanto esfregava o pano no chão e mostrava o resultado aos passageiros.
Na escada de acesso para a parte superior, o odor de urina estava impregnado nos degraus. Em compensação, ao chegar no primeiro andar o chão tinha um aspecto maior de limpeza. Um ponto positivo observado foi a localização dos coletes salva-vidas, que podiam ser encontrados tanto no centro do espaço quanto nas suas laterais. Por ali, o único problema que chegava a incomodar os passageiros era o calor e os assentos pouco confortáveis e com alguns rasgos.
Não à toa a estudante de Belas Artes, Jade Bianca, 22 anos, preferiu ficar na área externa apreciando a vista com a namorada, a negociadora jurídica Luciene Mota, de 30 anos. “Não tem circulação de ar, é tudo muito fechado na parte interna. Lá embaixo estava sem cabimento e, ainda assim, aqui em cima estava muito calor. Eu tive que sair da cabine para ficar do lado de fora”, diz.
No fim do corredor do primeiro andar, o lugar mais temido pelos passageiros: o banheiro. Lá, a primeira coisa observada é que não havia mau cheiro, mas o chão e as paredes estavam com aspecto de desgaste profundo. As três pias dispostas para lavagem estavam presas em partes enferrujadas da parede e o dispenser para usar o sabonete estava vazio. Por outro lado, a lixeira estava bem conservada e o secador de mãos estava funcionando normalmente.
Por sua vez, os sanitários causavam receio. Em um deles, a ferrugem havia tomado conta de mais da metade da tampa. Ao redor da base, o chão estava descascado e sujo. Não havia papel higiênico nas cabines, sendo preciso pegar o papel na entrada do banheiro, mas a quantidade existente lá era insuficiente. A prova disso é que quando a aposentada Graça Borges, 65 anos, precisou usar o sanitário saiu de lá inconformada.
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